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quinta-feira, outubro 24, 2013
ANIMAIS! Um texto de CORA RONAI
Acompanhei, através da transmissão feita pelos próprios ativistas, o resgate dos animais do Instituto Royal. A qualidade das imagens, feitas num celular, estava entre o péssimo e o sofrível, mas a sua carga de emoção foi maior do que a de muita superprodução. A cada coelho ou cachorrinho que saía do inferno, o público que acompanhava a ação na internet comemorava, mandando congratulações e palavras de estímulo e agradecimento aos heróis da madrugada.
Também acompanhei, no dia seguinte, os depoimentos dos diretores do instituto, que negam a existência de maus tratos nas suas dependências. Uma nota divulgada pela instituição, aliás, chegou a afirmar que os bichos teriam, lá, “as melhores condições de vida, com saúde, conforto, segurança e recreação”.
Que me desculpem os senhores diretores, mas é impossível levar a sério quem acredita que se podem usar tais termos em relação a animais que passam a vida em gaiolas, sendo submetidos a toda sorte de experiências dolorosas. Melhores condições de vida? Saúde? Conforto? Se a nota foi redigida de boa fé, mostra um completo distanciamento da realidade; se não foi, revela uma perigosa falta de compromisso com a verdade.
Aliás, há várias perguntas sem resposta em relação ao instituto. A primeira, e mais importante, é saber quem são os seus clientes. Como o Royal recebe verbas públicas, tem a obrigação de revelar para quem trabalha. Com isso se esclareceria boa parte das dúvidas que cercam a natureza dos testes lá realizados. Testar cosméticos e material de limpeza em animais, por exemplo, é prática condenada num número crescente de países. Na União Européia a legislação é tão severa que, no começo deste ano, foi proibida até a comercialização de produtos testados em animais, ainda que importados.
o O o
Sou contra a realização de testes em animais -- mas não tenho formação científica, e minha opinião sobre o assunto é, consequentemente, só isso, uma opinião. Por esse motivo, passo a palavra para o especialista Sérgio Greif, biólogo formado pela Unicamp, com mestrado na mesma universidade, co-autor do livro "A verdadeira face da experimentação animal: a sua saúde em perigo" e autor de "Alternativas ao uso de animais vivos na educação: pela ciência responsável":
"Se um pesquisador propusesse testar um medicamento para idosos utilizando como modelo moças de vinte anos; ou testar os benefícios de determinada droga para minimizar os efeitos da menopausa utilizando como modelo homens, certamente haveria um questionamento quanto à cientificidade de sua metodologia.
Isso porque assume-se que moças não sejam modelos representativos da população de idosos e que rapazes não sejam o melhor modelo para o estudo de problemas pertinentes às mulheres. Se isso é lógico, e estamos tratando de uma mesma espécie, por que motivo aceitamos como científico que se testem drogas para idosos ou para mulheres em animais que sequer pertencem à mesma espécie?
Por que aceitar que a cura para a AIDS esteja no teste de medicamentos em animais que sequer desenvolvem essa doença? E mesmo que o fizessem, como dizer que a doença se comporta nesses animais da mesma forma que em humanos? Mesmo livros de bioterismo reconhecem que o modelo animal não é adequado.
Dados experimentais obtidos de uma espécie não podem ser extrapolados para outras espécies. Se queremos saber de que forma determinada espécie reage a determinado estímulo, a única forma de fazê-lo é observando populações dessa espécie naturalmente recebendo esse estímulo ou induzi-lo em certa população.
Induzir o estímulo esbarra no problema da ética e da cientificidade. Primeira pergunta: será que é certo, será que é meu direito pegar indivíduos e induzir neles estímulos que naturalmente não estavam incidindo sobre eles? Segunda pergunta: será que é científico, se o organismo receber um estímulo induzido, de maneira diferente à forma como ele naturalmente se daria, será ele modelo representativo da condição real?"
A íntegra deste artigo pode ser lida na internet, em bit.ly/17HLVZn. Já a dra. Preci Grohman, médica, é professora aposentada da UFRJ, e fez cursos de pós-graduação nas universidades de Toronto e Londres. Ela escreveu o seguinte:
"Quando estudante, fiz experimentos com animais, recebendo bolsa do CNPq. Na época acreditava nessa prática. Já em Toronto e Londres utilizei cultura de células humanas .
Os cientistas, com seus experimentos, conseguem títulos de mestre ou doutor, o que resulta em promoções e aumento de salários. Isso os torna mais competitivos no mercado de trabalho. Seus supervisores também são agraciados com títulos e prestigio.
A criação de plantéis de animais para pesquisa também é muito lucrativa.
Certas drogas, inócuas em animais, já causaram grandes desgraças quando usadas em humanos. A mais conhecida foi a Talidomida. Macacos não desenvolvem câncer de pulmão mesmo sendo obrigados a tragar cigarros continuamente. Se a diversidade genética entre indivíduos da mesma espécie já é significativamente grande para levar a respostas diversas após um mesmo estimulo, o que se pode esperar entre diferentes espécies?
Pesquisas já são feitas com voluntários, podem ser feitas em criminosos que desejem reduzir suas penas ou ainda em culturas de células humanas. Se forem necessárias outras técnicas, os seres humanos devem ser competentes o suficiente para desenvolve-las. Um exemplo de desperdício na ciência é o descarte diário de milhares de cordões umbilicais, ricas fontes de células.
A manutenção até os dias de hoje de experimentos em animais visa puramente interesses financeiros, e já deveria ter sido abolida há decadas".
(O Globo, Segundo Caderno, 24.10.2013)
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Querida Marlí
ResponderExcluirExcelente texto!
Acho um absurdo submeter "bichinhos" a este sofrimento todo...
Fiquei chocada quando assistí a matéria pela tv
Deixo um beijo para tí
Beijinhos de
Verena e Bichinhos
É importante que haja manifestantes, para que assim possamos todos refletir e elaborar soluções! abraços
ResponderExcluirMarli,
ResponderExcluirhavia lido a crônica da Cora ontem no jornal e mais uma vez me colocado totalmente a favor da opinião da jornalista;agora ainda mais fortalecida pelas declarações pertinentes da doutora bióloga.
Como dois organismos distintos podem servir de parâmetros para um mesmo estímulo?Só poderia haver grandes interesses financeiros por trás de tudo.
Um abração,
Calu
Os manifestantes que resgataram os beagles merecem desfilar em carro de bombeiro, recebendo homenagens. Mas onde estão esses bichinhos, como estão sendo tratados, quem poderá adotá-los?
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirEvidentemente, também sou contra a maus tratos a animais. Difícil dar uma opinião, leigo que sou. O que está pegando é a falta de clareza, de informação, de respostas a todos os questionamentos do texto, mas uma coisa é certa: tudo isso é fruto do consumismo, do modismo, do materialismo que a sociedade criou. Vejo um pouco de hipocrisia nisso aí, embora engrosse a fileira dos inconformados com os possíveis maus tratos, pois é meio parecido com o carnaval:Todo mundo é contra maus tratos, mas vão para avenida com fantasias feitas de plumas e penas de avestruz e outras aves. Parabéns pelo questionamento.
ResponderExcluirEvidentemente, também sou contra a maus tratos a animais. Difícil dar uma opinião, leigo que sou. O que está pegando é a falta de clareza, de informação, de respostas a todos os questionamentos do texto, mas uma coisa é certa: tudo isso é fruto do consumismo, do modismo, do materialismo que a sociedade criou. Vejo um pouco de hipocrisia nisso aí, embora engrosse a fileira dos inconformados com os possíveis maus tratos, pois é meio parecido com o carnaval:Todo mundo é contra maus tratos, mas vão para avenida com fantasias feitas de plumas e penas de avestruz e outras aves. Parabéns pelo questionamento.
ResponderExcluirOlá Marli, muito boa e ilustrativa sua postagem, está passando da hora de termos alternativas mais "humanas" para os cientistas testarem suas descobertas.
ResponderExcluirforte abraço
c@urosa