quarta-feira, outubro 20, 2021

CARTÃO DE MEMÓRIA


Por que ainda estou guardando esses cartões?
Onde guardei?


-Marli Soares Borges


Sabe aqueles cartõezinhos de memória das máquinas digitais de antigamente? Pois eu tenho cinco. Todos guardados, desde o início do mundo, numa caixinha de plástico transparente. Pelos séculos dos séculos, há anos, sempre no mesmo lugar. Encontro-os de olhos fechados.

Sqn

Dia desses, resolvi fazer um destralhamento aqui em casa: bem me quer, mal me quer, isso eu quero, isso não quero. E fui povoando o lixo de coisas sem valor e absolutamente desnecessárias. Lá pelas tantas, dei de cara com a caixinha de plástico transparente. Abri e olhei. E contei: cinco cartões de memória. Por que ainda estou guardando esses cartões? minha câmera já era, hiper obsoleta, e quem quer bater fotos em câmeras obsoletas? Ah, chega de tralhas, dessa vez vai pro lixo. E plof! 

E continuei examinando e separando coisas.

Virei o pescoço e dei uma espiada no saco do lixo. Ali estava ela, minha caixinha, recheada de lindos memory cards! Tadinhos, estão comigo há tantos anos, a caixinha com os cartões. Que mal fizeram pra descartá-los assim? Me fiz de offline. Não consegui. Peguei a caixinha de novo: abri, olhei e guardei. Pois é guardei novamente. Meus tesouros, rs. E bem guardados que é pra eu não fazer besteira de novo. 

Felizmente essa foi minha única recaída, no mais, me destralhei total. Foram sacos e sacos de lixinhos, coisinhas, bobaginhas que não fazia mais o menor sentido guardá-las. E me senti ultra leve, menina passarinho, com vontade de voar.

Mas, nada é perfeito.

Dias depois, meu marido comprou pela internet umas câmaras sem fio "pra espalhar aqui no sítio, a gente está precisando", ele disse. Sabe aqueles cartões que tu vive guardando? agora eles terão utilidade, vamos precisar de três, quantos tu tens? Cinco eu disse, de supetão. (Bom eu ter tido aquela recaída, pensei orgulhosa).

Como a encomenda está quase chegando, fui direto pegar a caixinha com os cartões. Não achei. Não estava mais no antigo lugar, óbvio, no dia da arrumação tive um insight criativo, grrr, e mudei tudo de lugar. Meu Deus, onde guardei a caixinha? Lembrei. Óbvio que eu lembraria, - sei onde guardo tuuuudo aqui em casa -, vou ali pegar e já volto. Adivinha. Não achei. Revirei tudo e ... Nada! Desapareceram sem deixar vestígios. 

Mas eu conheço os bastidores. É tudo obra daquela gangue de duendes mau-caráter que vivem escondidos aqui em casa e adoram esconder minhas coisas. Fazem isso só pra me infernizar: eu guardo e eles escondem. E eu fico p da vida.

Como já vi esse filme, vou dar um tempo. O modus operandi deles é sempre o mesmo: eu guardo num lugar e eles, só pra incomodar, colocam em outro. E para completar, ainda fazem as coisas aparecerem num lugar onde eu já havia procurado um milhão de vezes! Da última vez fiquei tão indignada que prometi fritar-lhes o fígado um por um. Aí, eles tomaram tento e sumiram. Agora voltaram, os safados. 

Mas, dessa vez eles vão se dar mal. Prometi uns duplos carpados a São Longuinho, pode ser que ele me ajude.   

Tomara que dê tudo certo.

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quinta-feira, outubro 14, 2021

ALIMENTO MAIS DESPERDÍCIO É IGUAL A INDIGÊNCIA

Alimento+desperdício=indigência
16 DE OUTUBRO
DIA MUNDIAL DA ALIMENTAÇÃO

- Marli Soares Borges


Sobre questões alimentares, tenho visto muita coisa nesse mundo. Mas hoje não vou falar da fome, nem da vida dolorida e indigna de quem não tem o que comer. Quero falar de outra coisa que também  considero muito, muito triste: o desperdício alimentar. Fico indignada quando vejo desperdício de comida, descaso com o alimento. 

Tem pais sem a menor noção, que simplesmente não ensinam seus filhos a se alimentarem. Esses pais fazem parte de um segmento de gente, relativamente jovem e bem de vida. Gente "phyna" que não liga para "ninharias". Acham lindo empurrar comida na goela dos pirralhos e enchem o prato como se a criança fosse um gigante e a comida fosse fugir. E as pobres crianças, escondidas atrás de uma imensa torre alimentar, acabam ficando perdidas e não comem nada. Mas remexem e estragam a comida. Me dá tanto nojo dessas atitudes, que meu estômago chega a embrulhar. As crianças mal educadas desperdiçam comida graças a esses indivíduos preguiçosos, ignorantes e burros que se auto-intitulam "Os pais".  

Não consigo entender essa dinâmica, acho isso uma brutal estupidez, um tipo de coisa que me estressa e me ofende. Falta educação, falta visão, falta elegância, falta compaixão. Esses pais e mães são um triste exemplo do que não se deve fazer e ser. 

Qual é o problema em diminuir a quantidade de comida no prato das crianças e ensiná-las que é melhor repetir do que estragar? Qual é o problema em ensinar os filhos? Dá trabalho? Claro. A educação dói, quem não sabe? mas é necessária sob todos os pontos de vista. Nossa alimentação é sagrada, nosso corpo é sagrado, nós somos criaturas de Deus. Todos. TODOS. Por que estragar a comida que pode alimentar o outro? Me dá uma tristeza ver tanto desperdício e saber que tantos estão com a barriga doendo de fome. 

Fico pensando no que será dessas crianças "phynas" que estão se criando isentas de traquejo social e ambiental. Pobres adultos pobres. É isso que serão: pobres. Trabalharão somente pela comida, pois o futuro do mundo nas questões alimentares não é nada promissor, e com todo esse desperdício, a fome não tardará a chegar para todos. Para todos, eu disse. Os especialistas estão alertando. E o preço da comida, quando tiver, será estratosférico. Já é. Mas esses pais ineptos tem um cérebro de azeitona e não conseguem aquilatar o tamanho do prejuízo que estão causando aos filhos, a si próprios e ao mundo.

Santo Deus, antes que seja tarde, é preciso enfiar na cabeça desses adultos - pais e mães - que desperdício é sinônimo de burrice; desperdício atrai pobreza e limitação; desperdício é prenúncio de indigência material. O alimento precisa ser visto e tratado sob outra ótica: a ótica da suficiência. O suficiente para alimentar-se sem estragar, que esse sim, é o mais claro sinal de inteligência. 

A educação das crianças não pode prescindir da noção cósmica. Não precisa ir longe, logo ali, tem gente que não tem o que comer. Tem gente que tinha tudo e empobreceu e agora não tem mais nada. Querendo ou não, estamos todos conectados e nossas conexões são reais e precisas. 

Podemos fazer alguma coisa? Sim, cuidar do mais importante para nossa sobrevivência: nossos alimentos. Ensinar as crianças, desde pequenas, a não desperdiçarem comida. 

Pais! deixem de preguiça e ensinem seus filhos! O alimento que temos hoje e desperdiçamos, poderá faltar na nossa mesa amanhã. 

Por favor pais, pensem nisso. 

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Em tempo: 
  • Penso que os restaurantes deveriam cobrar pelo desperdício. Deixou comida no prato? Pague o preço. Adulto aprende muito bem quando mexem no seu bolso. 
  • O tema desse ano de 2021 tem uma proposta que vem totalmente ao encontro de tudo o que escrevi: “As nossas ações são o nosso futuro. Melhor produção, melhor nutrição, melhor ambiente e melhor qualidade de vida” fonte: Senado
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terça-feira, outubro 12, 2021

NOSSA SENHORA APARECIDA, PRECISAMOS DE TI.


... por favor, cuida de nossas crianças.
Nossa Senhora Aparecida, precisamos de ti


- Marli Soares Borges


Querida Nossa Senhora Aparecida, Mãe do povo brasileiro.

Hoje é teu dia.

De joelhos te homenageio e agradeço tuas intercessões. Mas hoje é também o dia das crianças, e as crianças brasileiras têm muita necessidade de ti, desse teu sentimento de mãe que sempre quer a felicidade dos filhos.

Por favor, cuida para que nossas crianças não percam a vida pela fome, nem pela droga, nem pela violência e nem por doenças curáveis. Livra-as do tédio e do vazio espiritual. Dá-lhes a luz da inteligência e da fé. Dá-lhes a compreensão e a coragem para que não sucumbam às tentações e não se percam na iniquidade.

E, se não for pedir demais, estende tua ajuda também para as mães e os pais dessas crianças. Dá-lhes a esperança e não deixe que desistam da educação de seus filhos. Não permita que abandonem suas crianças. Dá-lhes força e coragem e abranda seus corações, para que sigam os desígnios divinos rumo ao crescimento espiritual. 
Amém.

Img: "Nossa Senhora de Aparecida!!!" - Art: Mônica Alves Torres - Arte Naïf - Maceió - Brasil

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sexta-feira, outubro 08, 2021

A INTELIGÊNCIA DO CHINELO


bom mexer os dedos do pé
A inteligência do chinelo


- Marli Soares Borges


Por aqui os dias continuam chuvosos e frios. E estamos em plena primavera, na estação das flores, do sol e dos coloridos sazonais. Mas a querida "prima" não quer aparecer. E isso não está me cheirando bem. Tenho a impressão de que esse ano não teremos primavera, nem verão, e, se bobear, nem outono. Alguém avisa o inverno que ele acabou, por favor.

Ontem, distraída, até me assustei quando minha filha chegou e me presenteou com um chinelo crock, um número maior que o meu. "Ó mãe, um presente, se não gostar me devolve. Sei que tu não acha muito bonito, mas lembrei desse frio que não para e trouxe pra tu usar com tuas meias de lã". Ela sabe que meu sistema termo-regulador anda trabalhando em 'curto' e que sinto um frio colossal. E nesse non-stop do inverno...

Confesso que nunca vi nada de bonito nesses tais chinelos, mas adorei o presente e nem penso em devolver. Estou feliz da vida com meus pezinhos aquecidos, confortavelmente metidos na meia de tricô favorita e no chinelo crock que acabei de ganhar. Sei... eu vivia falando mal deles, tá bom, já engoli as palavras. Mas, será mesmo que esse povo - gamado no tal chinelo - acha ele bonito? ou acha confortável? ou as duas coisas? Não, as duas não combinam, rs. 

Ih, acabei de lembrar um detalhe super importante: será que ele gosta de acordar tarde como eu? O meu chinelo havaiana, que uso o ano inteiro, nunca se incomodou com isso. Ele fica ali, ao lado da cama, paciente, esperando eu acordar. Ele é meu queridinho e, só para esclarecer, eu jamais pensaria em abandoná-lo por causa do crock, apenas estou pensando em deixá-lo descansando na gaveta, por um tempo, até o frio passar, ai meu Deus, será que passa?  

Meus pés agora, bem agasalhados, até viraram gente. Ah, que bom! que sensação maravilhosa! Puro aconchego. Dei uma espiada neles, e sabe que nem achei o chinelo tão feio assim? pura implicância minha, pensei. Fazia tempo que não me sentia tão bem... que bom mexer os dedos do pé e senti-los todos ali, vivos, à postos, quentinhos e flexíveis. 

Chinelo inteligente esse. Chegou aqui de mansinho, jogou um calorzinho nos meus pés e me enrolou feito um novelo! Identificou com precisão o momento certo de agir: fomos apresentados e ele me deu um breve aperto de pé. Na sequência, uma conversinha boba e, para completar, um verãozinho pontual. Pronto, bastou. Tudo de caso pensado, na medida certa pra me apaixonar. Evidente que se eu me apaixonasse, ele moraria comigo e teria um teto pra chamar de seu. E caí na rede feito um peixinho. Mas, quer saber? Valeu! Quem não ama um chinelo assim? 

Hoje tem sol claro e céu azul e bem que poderia ser um lindo dia de primavera, mas não! tinha que ser esse ridículo dia de inverno, com prazo de validade vencido. Por sorte, meu crock não nega fogo. 


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sábado, outubro 02, 2021

O AMOR QUE NINGUÉM VÊ


O amor que ninguém vê
A solidariedade orgânica 
é um 
remédio do qual ninguém pode prescindir.


Não direi do amor romântico, do enlevo, do elã. Isso é com os poetas. Minha palavra tem outro enfoque: o amor-nosso-de-cada-dia, esse amor acanhado que temos uns pelos outros, o amor que ninguém vê. É impressionante os malabarismos que a gente tem que fazer pra viver essa aventura circunstancial de amar. E esse confinamento, essa pandemia piora tudo.

Nossa vida continua de pernas para o ar. As doidices também: manias de todas as cores, exageros alimentares, tvs ligadas dia e noite, celulares alucinados, gente que toma duzentos banhos por dia, mães de filhos pequenos imaginando quantos dias faltam pra ficarem loucas, toques de todos os quilates, faxinas intermináveis, gente resmungando aqui e ali. Filhos adolescentes tendo que aturar as manias dos pais. Pais tendo que suportar filhos mal humorados, metendo o bedelho em tudo, e deixando pratinhos pela casa inteira. E a mídia de goela aberta, vomitando desgraceiras. E tec-tec-tec, dá-lhe celular! E croc-croc-croc, dá-lhe comilança! até quando? Não sei. 

Calma. Tudo na vida tem os dois lados: se num dia a gente está querendo se afogar numa bacia de álcool gel, no outro podemos estar de boas, achando o confinamento uma solução razoável. O lado bom é que, com a pandemia, melhoramos as lentes e apuramos nosso olhar. E passamos a valorizar a essência das coisas: o cafezinho que o marido fez, os brinquedos que as crianças guardaram no lugar, as roupas que o marido lembrou de dobrar e guardar enquanto você se esmerava nas panelas; o filho adolescente que tirou o lixo e arrumou o quarto, a filha que deu uma geralzona na casa. E por aí vai. O cotidiano da vida tem muitas demandas, mas é fundamentalmente um dar e receber, forever and ever.  

Não é difícil ver nas ações diárias o gesto expressivo do amor. O que dificulta é a superficialidade que durante muitos anos fez a nossa cabeça. E a mania de grandeza: só valem as grandes coisas (geralmente eventuais). As pequenas coisas (diárias) a gente reclama, mas não liga quando alguém faz. Errado! Os detalhes diários é que fazem a festa, e, mesmo que as tarefas estejam sendo executadas à contragosto, na marra, não importa, esse trabalho tem que ser valorizado, senão as pessoas começam a murchar. Não existe um “comportamento padrão” para confinamentos. Para quê uns ficarem patrulhando os outros?

Sozinha diante do teclado e pensando nisso tudo, vejo como é importante praticar, aceitar e entender esse amor vital e palpável. Sem preconceitos, sem críticas, sem ranços familiares, sem julgamentos. Esse tempo adverso requer compreensão. Não está fácil para ninguém. 

Aceite de bom grado esse eu-te-amo soletrado em cada tarefa executada. Porque o amor, além de ser um sentimento interior é uma atitude exterior e a solidariedade orgânica é um remédio do qual ninguém pode prescindir. A parcela de colaboração diária de cada um, em casa, é vital para todos e ninguém deve se omitir.

Engraçado como essas coisas passavam batido antes da pandemia. 

-Marli Soares Borges-

terça-feira, setembro 28, 2021

O LIVRO DA VIDA


Qual será a primeira história que vou ler?
O Livro da Vida

Eu sempre soube que naquele livro havia mais do que histórias. Muito mais. Aquele livro sempre me fascinou, era tão lindo, tão poderoso. Capa dura, grandes letras douradas. A lombada, a gente via de longe, tão bonita que era. E meu avô vivia lendo, que é pra ter o que te contar, menina! Depois ele guardava o livro, sempre embrulhado num papel de seda. E me contava as histórias, algumas bem tristes, outras alegres e engraçadas. E eu adorava. Ele era um homem bom, muito alegre e de bem com a vida. E sabia contar histórias com alma. E assim como eu chorava, eu também dava boas risadas.

Então cresci e fui cuidar da minha vida. 

Numa manhã, no dia em que completaria 84, meu avô se foi. Fechou os olhos tranquilamente e foi ter com os anjos. E minha vó me deu o livro, dizendo que ele havia deixado para mim. O embrulho era o mesmo, o papel de seda surrado. Eu, morta de tristeza, nem abri o pacote, era muito recente a partida do meu querido contador de histórias, o homem que recheou minha infância de quimeras. Coloquei o livro na estante e prometi a mim mesmo que um dia iria abri-lo para me deliciar. 

O tempo foi passando e minhas crianças crescendo, então lembrei do livro. É agora, pensei, vou matar vários tipos de saudade e ainda abastecer minha mente com lindas histórias para encantar meus filhos.

Feliz da vida corri para a estante. E não é que comecei a tremer? Minhas recordações avivaram-se e a emoção tomou conta de mim. Qual será a primeira história que vou ler? E qual será a primeira que vou contar para meus filhos? 

Lembrei de uma que ele contava e que sempre me fazia chorar: uma família pobre, onze irmãos, todos crianças. Os meninos ajudando na roça e as meninas em casa, cuidando dos pequenos, das limpezas e da comida. Aquela mesa compriiiiiida e aquela panelona, todos os dias... quase sempre a mesma comida, e aquela mãe, sempre trabalhando na roça com o pai, e... sempre grávida. Pobre mulher. Com aquele barrigão e arando aquela terra ressequida, dura como pedra, naquele sol escaldante. De vez em quando ela parava e secava o rosto com a ponta do avental. E colocava as mãos nas cadeiras e forçava as costas para trás, para aliviar a dor. E prosseguia.

Quase chorei de novo.

Ah, meu Deus, com tantas histórias alegres e engraçadas, fui lembrar logo dessa? Não, essa não vou contar primeiro. E eu escutava a voz dele: "espera crescer menina, tu vais encontrar muitas histórias bonitas nesse livro aqui". 

Peguei o livro e corri os olhos para o título: O LIVRO DA VIDA. 

O tempo modifica tanto as coisas... lembrei de meu avô embrulhando o livro para que não estragasse. Não adiantou. As páginas estavam amareladas, as letras apagadas e quase nada havia para ler. Inexplicavelmente duas páginas intactas. Abri. Então pude ver a letra tremida do meu avô: "Vai, menina, agora é a tua vez de ler o livro da vida! Vai e conta tuas histórias para os teus. As minhas eu já contei".

Finalmente entendi tudo. Descobri onde ele "lia" as histórias que me contava. Meu avô era o irmão mais velho numa família de onze irmãos.


- Marli Soares Borges -


NOTA:
Esta é minha participação na BC da Norma: "Histórias do viver" do Blog Pensando em Família. A proposta é utilizar a imagem do post e narrar uma história, ou seja, "selecione um fragmento, evento, uma situação ou fase significativa da sua existência para compartilhar".

sábado, setembro 25, 2021

A DANÇA DAS FLORES

Flores de Georgia O'Keeffe
A Dança da Flores - Blog da Marli

Que lugar é esse, um lugar estranho e fantástico, fonte de prazer e de dor, porta que se abre para dar vida? É isso que me ocorre quando observo essa imagem poderosa, esse manifesto de beleza e sensualidade no desenho dessa flor. Bem que eu gostaria de fazer uma poesia, colorir umas palavras... mas, já viu, eu não sei escrever bonito. Então convidei um poeta... e se você é da minha época, vai lembrar: Jorge Alberto Mendes Ribeiro. E ele vem com um poema maravilhoso, simples e delicado e que tem tudo a ver com a explosão de sentimentos que essa tela é capaz de evocar em mim.

"Amor, causa e consequência"

suavemente
como se as nuvens do céu me recobrissem
e todos os meus poros pressentissem
a espera de anseios libertados.

docemente...
como se os favos de mel do paraíso 
embrulhados, amor em teu sorriso
pelas mãos de Deus me fossem dados...

mansamente...
como a noite entrando pelo dia,
nossa sede de afeto se sacia,
na troca de carinhos vivenciados.

repetidamente...
como quem decora os teus sinais,
eu me aprofundo em ti, cada vez mais, 
e tenho os teus encantos por sagrados.

lentamente... 
como que vertendo nossa essência,
tu és a causa, eu sou a consequência,
e nós dois..um do outro..resultado!

 

As flores de Georgia O'Keeffe

Resolvi trazer umas flores pra você ver. Amo os quadros da Georgia, tanto as paisagens abstratas quanto as flores. Ela foi uma das primeiras pintoras a conquistar reconhecimento mundial dos críticos e do público com suas imagens inovadoras que ousaram desafiar as percepções da época. 
Georgia O’Keeffe (1887-1986). 

                 Flores de Georgia O'Keeffe            Flores de Georgia O'Keeffe             

     Flores de Georgia O'Keeffe          Flores de Georgia O'Keeffe

        Flores de Georgia O'Keeffe            Flores de Georgia O'Keeffe   

           Flores de Georgia O'Keeffe        Flores de Georgia O'Keeffe
 
   Flores de Georgia O'KeeffeFlores de Georgia O'Keeffe

A melhor definição para as representações florais de Georgia O'Keeffe foram ditas pela própria artista na apresentação do catálogo da exposição "An American Place - 1931"
"Uma flor é relativamente pequena. Todo mundo tem muitas associações com uma flor - a ideia de flores. Você estende a mão para tocar a flor - inclina-se para a frente para cheirá-la - talvez toque com seus lábios quase sem pensar - ou a ofereça a alguém para agradá-lo. Ainda assim - de certa forma - ninguém vê uma flor - realmente - é tão pequena - não temos tempo - e ver leva tempo, assim como ter um amigo leva tempo... Então eu disse para mim mesma - vou pintar o que eu vejo - o que a flor é para mim, mas eu vou pintá-la grande e eles ficarão surpreendidos ao levarem tempo para observá-la - Vou fazer até os nova-iorquinos ocupados perderem um tempo para ver o que eu vejo nas flores..." 
E aí, que me dizem?

- Marli Soares Borges -

terça-feira, setembro 21, 2021

DOCE SOFRIMENTO


Pratique a alegria
É mais fácil sofrer do que manter a alegria


Você já notou como tem gente que adora sofrer e se lamentar? que estão sempre ligadas na sofrência?

Fico pensando, de onde teria vindo essa quedinha que temos, em maior ou menor grau, para o sofrimento. Realmente não sei, tenho apenas uma vaga ideia. Lembro que quando eu era criança, às vezes me machucava brincando e chorava, e minha vó corria e me acalentava... e eu ficava feliz. Aliás, todo mundo faz assim com as crianças, é super normal. Também cansei de ouvir "quem não chora não mama". Daí vai que chorar e sofrer virou uma saída. Tenho a impressão, - como disse, é só uma ideia, - de que essas atitudes levam alguns de nós a intuir desde cedo que sofrer sempre traz compensação.

A bem da verdade, é muito mais fácil sofrer do que manter a alegria. Para sofrer a gente nem precisa fazer esforço, o sofrimento vem ao natural. E nós mulheres, principalmente, carregamos um fardo que nos acompanha desde os tempos bíblicos. Sempre fomos encorajadas a sofrer: o sofrimento dignifica, diziam, tudo que se conquista pelo sofrimento tem mais sabor, (pura besteira...) e desfiavam um rosário de sandices na nossa cabeça, e o sofrimento grassou. E nossa saúde (física, mental e social) desmoronou, também pudera, isso acaba com qualquer um. 

Agora, o outro lado da moeda. 

Todo mundo gosta da alegria, tenho certeza. Então porque a gente não vive alegre? Sabemos por experiência própria que a alegria é um sentimento ótimo, nos encoraja e fortalece em nossas tempestades. Nos dá mais saúde, rejuvenesce e embeleza. Quando sorrimos, nosso organismo fabrica anticorpos para combater as doenças. Pura ciência, e da boa...rs. Meu Deus, porque então a gente não sorri mais? Por que a gente não escancara a boca de orelha-a-orelha todos os dias? 

Não sei, mas acho que, aquela história de que "sofrer dignifica", há muito vem contribuindo para impedir que cultivemos, (como uma plantinha), o hábito saudável de manter-nos alegres, mesmo nas adversidades. Parece que temos até vergonha de dizer que passamos uma tarde alegre no nosso trabalho. E o que dizer da culpa, quando estamos alegres no cotidiano, sem alguma razão aparente que possa justificar? 

Embora saiba que manter alegria na vida não é nada fácil, sou a favor da alegria. Sofrer por sofrer me dá nos nervos. E mania de lamentar-se, pior ainda. Acredito que a alegria está entre os ingredientes que tornam nossa vida mais agradável e, portanto, deve ser praticada e doada ao próximo, pois alegria também é uma forma de amor. Amor pela vida e pelas pessoas. 

Então proponho uma coisa.

Sei que tristezas e sofrimentos não são opcionais e que às vezes é difícil até acordar e levantar da cama de manhã. Mas uma hora vai passar. E mesmo que você esteja "até aqui" com a vida, dê um tempo para você. Pratique a alegria. Pra-ti-que. Se está triste e quiser chorar, chore, soluce, entre no buraco, faça o luto, faça o que lhe der na telha, mas depois, (eu falei depois), levante a cabeça, olhe-se no espelho e sorria. (Não, não é bobagem). Sorria mesmo. 

Dê uma espiada nesse truque para enganar o cérebro:

Olhe-se no espelho e sorria de orelha-a-orelha. Force e segure o sorriso, um pouquinho só. Conte até seis. Assim você engana seu cérebro e sem se dar conta, você ficará alegre. Repita uma vez. Até dentro do carro dá pra fazer. Tente, dá certo.

Aprendi isso há bastante tempo num livro, já nem lembro mais o nome, mas é muito legal. Claro, no início a gente custa um pouco, parece meio over, ainda mais quando a gente está no meio da tempestade. Mas vale a tentativa, é um esforço pessoal, um aprendizado, um novo olhar. E a gente consegue recuperar as forças. Não duvide. 

E sorria, pois como dizia Chaplin, a alegria é o único jeito da gente enfrentar os problemas da vida e sair ganhando! Mas não esqueça de levantar a cabeça. Aposto que você nunca viu alguém chorar de cabeça erguida não é mesmo? 

- Marli Soares Borges -