quinta-feira, janeiro 31, 2013

WAKE UP CALL


Quero escrever, dizer algumas coisas, mas sinto que as palavras estão meio contidas. Acho que é efeito da tristeza, dessa mágoa imensa que estou sentindo por causa dos últimos acontecimentos. Por causa daqueles jovens que perderam suas vidas, seus sonhos, seu futuro. Por causa dos familiares que ficaram sem chão. Por causa de minha cidade, Santa Maria, que está chorando. Quero arrancar do meu peito a raiva que sinto dessa tragédia criminosa, dessa estupidez, dessa ganância generalizada que põe uma pedra no coração das pessoas e lhes tira a empatia e o raciocínio.


Foi sim uma tragédia anunciada: o extintor, o isolamento acústico, a saída de emergência, a comanda na saída, os seguranças sem comunicação entre si, a superlotação, a licença vencida. Caramba. E corrupção, será que não houve? E o maldito jeitinho brasileiro, será que não driblou as normas técnicas de segurança? Isso tudo tem de ser averiguado nos mínimos detalhes, pois a tal casa de shows jamais poderia estar funcionando naquelas condições! Não tinha esse direito, lida e vive das muitas gentes que ali comparecem. Negligência, imperícia e imprudência, ninguém ouviu falar de tais ilicitudes? E a culpa? E o dolo? Me revolto com essas coisas, porque acho que há algo errado com o meio e com os interesses das pessoas. Parece que está tudo embaçado. Onde estão os agentes públicos responsáveis pela fiscalização? Quem deu o alvará? Quem cometeu as ações ou omissões que permitiram o funcionamento da boate? E o Governo que não dá satisfação nenhuma à população? Só vem com aquela conversinha mole de que vai fazer isso e aquilo e até agora não fez nada. Está esperando o quê? Diz que vai enviar ofício para que os bombeiros liberem a documentação? Ofício? Ora pois. Pelo que tenho visto, só o setor privado está na berlinda: os músicos, os donos da boate e os seguranças estão sendo apontados. Não que estejam isentos de culpa, mas tem mais alguém aí nessa jogada. Ah, deve ter! Todo esse conjunto de atitudes, a meu ver, manifesta a experiência empobrecida do nosso tempo em que a vida humana não é levada em consideração quando concorre com o dinheiro. Ora, sem prevenção é só uma questão de tempo para que qualquer tragédia aconteça. Quem não sabe disso? Quem não "sente" isso? Mas não! A moeda de troca em primeiro lugar. Não sou nenhuma tonta pra não valorizar o dinheiro, mas daí a optar pelo dinheiro e desprezar a vida humana, a distância é muito grande. Sei, ninguém está livre de perder a vida num acidente, mas acidente não é a mesma coisa que crime. E crimes pedem Justiça. E Justiça tem de ser feita. Se o poder público tem culpa? Óbvio. Se não restar comprovado o dolo, no mínimo haverá culpa. E sem essa de fazer de conta que não viu e seguir fugindo das responsabilidades.

© Marli Soares Borges