Histórias de Cronópios e Famas |
- Marli Soares Borges
Eu tinha cinquenta e poucos anos quando li esse livro pela primeira vez, (alguns anos depois, li de novo) e comecei a tentar descobrir se sou mais Cronópio ou mais Fama. Ainda lembro de alguém, um dia, ter me falado pra eu relaxar um pouco, ser um pouco mais cronópio, rs. O fato é que passei um bom tempo da minha vida me questionando se as decisões e atitudes que eu tomava eram coisa dos cronópios destrambelhados ou dos famas organizados e chatos, sem imaginação.
E por que estou falando nisso agora? Porque ando com vontade de ler novamente Júlio Cortázar e sempre que penso nele, eu penso nesse livro, e se alguém me perguntasse que livro eu gostaria de ter escrito, responderia sem pestanejar: "Histórias de cronópios e de famas". Que livro sensacional, leitura leve e divertida, recheada de reflexão e (muito) humor nonsense.
Faz um tempão que li e não lembro mais dos detalhes, (e também não quero pesquisar na internet; quero mais é exercitar minha memória antiguinha, rs). Lembro que eram histórias curtas e que uma delas dava título ao livro.
A impressão que ficou em mim é que esse livro é muito doido. Na época, ele simplesmente virou meu mundo de cabeça para baixo. Imagina alguém te ensinar coisas banais como subir e descer escadas e até mesmo como chorar. Pois é, isso você encontra no livro. É nítido o desafio às nossas noções de normalidade. Sem falar no amontoado de situações engraçadas onde o absurdo nos ajuda a perceber que a normalidade não passa de uma construção social. Quer ver? pense na conduta que usualmente temos nos velórios. Não precisa falar, todos sabemos como é. Agora imagine uma família cuja principal ocupação consiste em invadir velórios de desconhecidos e conquistar todos os papéis de destaque reservados para os familiares e íntimos do falecido. Tudo muuuito normal, rs.
E por aí vai.
Resumo da ópera: (o que penso agora, sobre o que li outrora, rs) as pequenas narrativas que compõem o livro, são ao mesmo tempo engraçadas e tocantes. Lembro que minha percepção da realidade ia se alterando à medida que eu avançava na leitura, ou seja, eu pensava uma coisa e era outra. Tudo muito bizarro, rs. Enfim, como eu já disse, adorei o livro, tanto que estou afim de ler novamente; mas, pensando bem... e não é que comecei a encasquetar com uma bobagem? será que vou gostar do livro agora? Será que vale a pena ler de novo? tanto tempo passou, tanta coisa mudou, eu própria mudei tanto. Será que nesse amanhecer de 2022, aos 72 anos, vou ler o livro e pegar de novo a mania de classificar todas as pessoas que conheço? Sei lá, é ler de novo para ver.