Embora a grande mídia brasileira faça de conta que nada acontece e insista em noticiar somente as ações nefastas dos vândalos, -- aqueles paus-mandados, que tudo fazem para desmerecer o protesto --, sabemos que o povo brasileiro está nas ruas escrevendo sua história. Uma história que espero, seja de conquista e de sucesso. História que começou com foco no transporte público e evoluiu, trazendo à lume outras carências que temos suportado por décadas. A meu ver, já somos vencedores pois obtivemos uma conquista sem precedentes na história, uma conquista de cidadania. Até hoje nunca havia acontecido que indivíduos se mobilizassem para um propósito, fazendo tratativas apenas nas redes sociais. Pois não é que aconteceu? As pessoas combinaram e saíram à rua para se manifestar e, embora sem espaços para atuarem, foram impondo sua participação, empurrando a realidade para frente, e interferindo diretamente nela. Isso é inédito e me parece que com essa atitude inauguramos uma nova era, um comportamento social cujo despontar acena para uma cidadania que não está mais na dependência de governos, partidos ou sindicatos para exercer seu direito legitimo de manifestar sua indignação nas ruas! Num olhar de superfície parece que esses movimentos não têm lideranças, mas é evidente que têm! São lideranças difusas, múltiplas, que não andam à cata de holofotes. -- Um novo modelo de democracia talvez? -- E os políticos estão atônitos no meio disso tudo. Jamais esperavam que sua autoridade fosse desafiada pelo povo, num movimento espontâneo, sem precedentes na história. Juntos protestamos e colocamos os políticos na berlinda, chega de roubalheira. O povo cabisbaixo, carregador de piano e pagador das contas da corrupção está definitivamente enterrado. Será mesmo que está? Ops, fugi do assunto. Voltando. Já obtivemos sucesso naquilo que foi nosso foco inicial. Eles recuaram nos preços das passagens. Mas a luta continua e, é claro que podemos aumentar nossa pontuação. Anote aí. O sucesso de qualquer demanda, e aqui não é diferente, supõe e inclui a clareza de ideias, -- de preferência muito bem expostas --, numa pauta de reivindicações. Assim facilita o diálogo e objetiva o resultado. Por último um detalhe não menos importante: como anda nosso comportamento individual? Acho que precisa ser revisto, e, por um simples motivo: como partes do todo que somos, nossa conexão é real. Então, não tem sentido sairmos às ruas exigindo mudanças, se não mudarmos também nossa conduta pessoal, abandonando de vez, as pequenas corrupções que protagonizamos na vida diária. Para quem ainda não se deu conta, preste atenção: a corrupção além de intrínseca é endêmica. O que me leva a crer que, se quisermos que o país mude, precisamos antes mudar nossas próprias atitudes. E nisso sou irredutível e obsessiva: se não mudarmos, como o país mudará?
© Marli Soares Borges, 2013