sexta-feira, outubro 08, 2021

A INTELIGÊNCIA DO CHINELO


bom mexer os dedos do pé
A inteligência do chinelo


- Marli Soares Borges


Por aqui os dias continuam chuvosos e frios. E estamos em plena primavera, na estação das flores, do sol e dos coloridos sazonais. Mas a querida "prima" não quer aparecer. E isso não está me cheirando bem. Tenho a impressão de que esse ano não teremos primavera, nem verão, e, se bobear, nem outono. Alguém avisa o inverno que ele acabou, por favor.

Ontem, distraída, até me assustei quando minha filha chegou e me presenteou com um chinelo crock, um número maior que o meu. "Ó mãe, um presente, se não gostar me devolve. Sei que tu não acha muito bonito, mas lembrei desse frio que não para e trouxe pra tu usar com tuas meias de lã". Ela sabe que meu sistema termo-regulador anda trabalhando em 'curto' e que sinto um frio colossal. E nesse non-stop do inverno...

Confesso que nunca vi nada de bonito nesses tais chinelos, mas adorei o presente e nem penso em devolver. Estou feliz da vida com meus pezinhos aquecidos, confortavelmente metidos na meia de tricô favorita e no chinelo crock que acabei de ganhar. Sei... eu vivia falando mal deles, tá bom, já engoli as palavras. Mas, será mesmo que esse povo - gamado no tal chinelo - acha ele bonito? ou acha confortável? ou as duas coisas? Não, as duas não combinam, rs. 

Ih, acabei de lembrar um detalhe super importante: será que ele gosta de acordar tarde como eu? O meu chinelo havaiana, que uso o ano inteiro, nunca se incomodou com isso. Ele fica ali, ao lado da cama, paciente, esperando eu acordar. Ele é meu queridinho e, só para esclarecer, eu jamais pensaria em abandoná-lo por causa do crock, apenas estou pensando em deixá-lo descansando na gaveta, por um tempo, até o frio passar, ai meu Deus, será que passa?  

Meus pés agora, bem agasalhados, até viraram gente. Ah, que bom! que sensação maravilhosa! Puro aconchego. Dei uma espiada neles, e sabe que nem achei o chinelo tão feio assim? pura implicância minha, pensei. Fazia tempo que não me sentia tão bem... que bom mexer os dedos do pé e senti-los todos ali, vivos, à postos, quentinhos e flexíveis. 

Chinelo inteligente esse. Chegou aqui de mansinho, jogou um calorzinho nos meus pés e me enrolou feito um novelo! Identificou com precisão o momento certo de agir: fomos apresentados e ele me deu um breve aperto de pé. Na sequência, uma conversinha boba e, para completar, um verãozinho pontual. Pronto, bastou. Tudo de caso pensado, na medida certa pra me apaixonar. Evidente que se eu me apaixonasse, ele moraria comigo e teria um teto pra chamar de seu. E caí na rede feito um peixinho. Mas, quer saber? Valeu! Quem não ama um chinelo assim? 

Hoje tem sol claro e céu azul e bem que poderia ser um lindo dia de primavera, mas não! tinha que ser esse ridículo dia de inverno, com prazo de validade vencido. Por sorte, meu crock não nega fogo. 


* * * * * * * * * *

sábado, outubro 02, 2021

O AMOR QUE NINGUÉM VÊ


O amor que ninguém vê
A solidariedade orgânica 
é um 
remédio do qual ninguém pode prescindir.


Não direi do amor romântico, do enlevo, do elã. Isso é com os poetas. Minha palavra tem outro enfoque: o amor-nosso-de-cada-dia, esse amor acanhado que temos uns pelos outros, o amor que ninguém vê. É impressionante os malabarismos que a gente tem que fazer pra viver essa aventura circunstancial de amar. E esse confinamento, essa pandemia piora tudo.

Nossa vida continua de pernas para o ar. As doidices também: manias de todas as cores, exageros alimentares, tvs ligadas dia e noite, celulares alucinados, gente que toma duzentos banhos por dia, mães de filhos pequenos imaginando quantos dias faltam pra ficarem loucas, toques de todos os quilates, faxinas intermináveis, gente resmungando aqui e ali. Filhos adolescentes tendo que aturar as manias dos pais. Pais tendo que suportar filhos mal humorados, metendo o bedelho em tudo, e deixando pratinhos pela casa inteira. E a mídia de goela aberta, vomitando desgraceiras. E tec-tec-tec, dá-lhe celular! E croc-croc-croc, dá-lhe comilança! até quando? Não sei. 

Calma. Tudo na vida tem os dois lados: se num dia a gente está querendo se afogar numa bacia de álcool gel, no outro podemos estar de boas, achando o confinamento uma solução razoável. O lado bom é que, com a pandemia, melhoramos as lentes e apuramos nosso olhar. E passamos a valorizar a essência das coisas: o cafezinho que o marido fez, os brinquedos que as crianças guardaram no lugar, as roupas que o marido lembrou de dobrar e guardar enquanto você se esmerava nas panelas; o filho adolescente que tirou o lixo e arrumou o quarto, a filha que deu uma geralzona na casa. E por aí vai. O cotidiano da vida tem muitas demandas, mas é fundamentalmente um dar e receber, forever and ever.  

Não é difícil ver nas ações diárias o gesto expressivo do amor. O que dificulta é a superficialidade que durante muitos anos fez a nossa cabeça. E a mania de grandeza: só valem as grandes coisas (geralmente eventuais). As pequenas coisas (diárias) a gente reclama, mas não liga quando alguém faz. Errado! Os detalhes diários é que fazem a festa, e, mesmo que as tarefas estejam sendo executadas à contragosto, na marra, não importa, esse trabalho tem que ser valorizado, senão as pessoas começam a murchar. Não existe um “comportamento padrão” para confinamentos. Para quê uns ficarem patrulhando os outros?

Sozinha diante do teclado e pensando nisso tudo, vejo como é importante praticar, aceitar e entender esse amor vital e palpável. Sem preconceitos, sem críticas, sem ranços familiares, sem julgamentos. Esse tempo adverso requer compreensão. Não está fácil para ninguém. 

Aceite de bom grado esse eu-te-amo soletrado em cada tarefa executada. Porque o amor, além de ser um sentimento interior é uma atitude exterior e a solidariedade orgânica é um remédio do qual ninguém pode prescindir. A parcela de colaboração diária de cada um, em casa, é vital para todos e ninguém deve se omitir.

Engraçado como essas coisas passavam batido antes da pandemia. 

-Marli Soares Borges-

terça-feira, setembro 28, 2021

O LIVRO DA VIDA


Qual será a primeira história que vou ler?
O Livro da Vida

Eu sempre soube que naquele livro havia mais do que histórias. Muito mais. Aquele livro sempre me fascinou, era tão lindo, tão poderoso. Capa dura, grandes letras douradas. A lombada, a gente via de longe, tão bonita que era. E meu avô vivia lendo, que é pra ter o que te contar, menina! Depois ele guardava o livro, sempre embrulhado num papel de seda. E me contava as histórias, algumas bem tristes, outras alegres e engraçadas. E eu adorava. Ele era um homem bom, muito alegre e de bem com a vida. E sabia contar histórias com alma. E assim como eu chorava, eu também dava boas risadas.

Então cresci e fui cuidar da minha vida. 

Numa manhã, no dia em que completaria 84, meu avô se foi. Fechou os olhos tranquilamente e foi ter com os anjos. E minha vó me deu o livro, dizendo que ele havia deixado para mim. O embrulho era o mesmo, o papel de seda surrado. Eu, morta de tristeza, nem abri o pacote, era muito recente a partida do meu querido contador de histórias, o homem que recheou minha infância de quimeras. Coloquei o livro na estante e prometi a mim mesmo que um dia iria abri-lo para me deliciar. 

O tempo foi passando e minhas crianças crescendo, então lembrei do livro. É agora, pensei, vou matar vários tipos de saudade e ainda abastecer minha mente com lindas histórias para encantar meus filhos.

Feliz da vida corri para a estante. E não é que comecei a tremer? Minhas recordações avivaram-se e a emoção tomou conta de mim. Qual será a primeira história que vou ler? E qual será a primeira que vou contar para meus filhos? 

Lembrei de uma que ele contava e que sempre me fazia chorar: uma família pobre, onze irmãos, todos crianças. Os meninos ajudando na roça e as meninas em casa, cuidando dos pequenos, das limpezas e da comida. Aquela mesa compriiiiiida e aquela panelona, todos os dias... quase sempre a mesma comida, e aquela mãe, sempre trabalhando na roça com o pai, e... sempre grávida. Pobre mulher. Com aquele barrigão e arando aquela terra ressequida, dura como pedra, naquele sol escaldante. De vez em quando ela parava e secava o rosto com a ponta do avental. E colocava as mãos nas cadeiras e forçava as costas para trás, para aliviar a dor. E prosseguia.

Quase chorei de novo.

Ah, meu Deus, com tantas histórias alegres e engraçadas, fui lembrar logo dessa? Não, essa não vou contar primeiro. E eu escutava a voz dele: "espera crescer menina, tu vais encontrar muitas histórias bonitas nesse livro aqui". 

Peguei o livro e corri os olhos para o título: O LIVRO DA VIDA. 

O tempo modifica tanto as coisas... lembrei de meu avô embrulhando o livro para que não estragasse. Não adiantou. As páginas estavam amareladas, as letras apagadas e quase nada havia para ler. Inexplicavelmente duas páginas intactas. Abri. Então pude ver a letra tremida do meu avô: "Vai, menina, agora é a tua vez de ler o livro da vida! Vai e conta tuas histórias para os teus. As minhas eu já contei".

Finalmente entendi tudo. Descobri onde ele "lia" as histórias que me contava. Meu avô era o irmão mais velho numa família de onze irmãos.


- Marli Soares Borges -


NOTA:
Esta é minha participação na BC da Norma: "Histórias do viver" do Blog Pensando em Família. A proposta é utilizar a imagem do post e narrar uma história, ou seja, "selecione um fragmento, evento, uma situação ou fase significativa da sua existência para compartilhar".

sábado, setembro 25, 2021

A DANÇA DAS FLORES

Flores de Georgia O'Keeffe
A Dança da Flores - Blog da Marli

Que lugar é esse, um lugar estranho e fantástico, fonte de prazer e de dor, porta que se abre para dar vida? É isso que me ocorre quando observo essa imagem poderosa, esse manifesto de beleza e sensualidade no desenho dessa flor. Bem que eu gostaria de fazer uma poesia, colorir umas palavras... mas, já viu, eu não sei escrever bonito. Então convidei um poeta... e se você é da minha época, vai lembrar: Jorge Alberto Mendes Ribeiro. E ele vem com um poema maravilhoso, simples e delicado e que tem tudo a ver com a explosão de sentimentos que essa tela é capaz de evocar em mim.

"Amor, causa e consequência"

suavemente
como se as nuvens do céu me recobrissem
e todos os meus poros pressentissem
a espera de anseios libertados.

docemente...
como se os favos de mel do paraíso 
embrulhados, amor em teu sorriso
pelas mãos de Deus me fossem dados...

mansamente...
como a noite entrando pelo dia,
nossa sede de afeto se sacia,
na troca de carinhos vivenciados.

repetidamente...
como quem decora os teus sinais,
eu me aprofundo em ti, cada vez mais, 
e tenho os teus encantos por sagrados.

lentamente... 
como que vertendo nossa essência,
tu és a causa, eu sou a consequência,
e nós dois..um do outro..resultado!

 

As flores de Georgia O'Keeffe

Resolvi trazer umas flores pra você ver. Amo os quadros da Georgia, tanto as paisagens abstratas quanto as flores. Ela foi uma das primeiras pintoras a conquistar reconhecimento mundial dos críticos e do público com suas imagens inovadoras que ousaram desafiar as percepções da época. 
Georgia O’Keeffe (1887-1986). 

                 Flores de Georgia O'Keeffe            Flores de Georgia O'Keeffe             

     Flores de Georgia O'Keeffe          Flores de Georgia O'Keeffe

        Flores de Georgia O'Keeffe            Flores de Georgia O'Keeffe   

           Flores de Georgia O'Keeffe        Flores de Georgia O'Keeffe
 
   Flores de Georgia O'KeeffeFlores de Georgia O'Keeffe

A melhor definição para as representações florais de Georgia O'Keeffe foram ditas pela própria artista na apresentação do catálogo da exposição "An American Place - 1931"
"Uma flor é relativamente pequena. Todo mundo tem muitas associações com uma flor - a ideia de flores. Você estende a mão para tocar a flor - inclina-se para a frente para cheirá-la - talvez toque com seus lábios quase sem pensar - ou a ofereça a alguém para agradá-lo. Ainda assim - de certa forma - ninguém vê uma flor - realmente - é tão pequena - não temos tempo - e ver leva tempo, assim como ter um amigo leva tempo... Então eu disse para mim mesma - vou pintar o que eu vejo - o que a flor é para mim, mas eu vou pintá-la grande e eles ficarão surpreendidos ao levarem tempo para observá-la - Vou fazer até os nova-iorquinos ocupados perderem um tempo para ver o que eu vejo nas flores..." 
E aí, que me dizem?

- Marli Soares Borges -

terça-feira, setembro 21, 2021

DOCE SOFRIMENTO


Pratique a alegria
É mais fácil sofrer do que manter a alegria


Você já notou como tem gente que adora sofrer e se lamentar? que estão sempre ligadas na sofrência?

Fico pensando, de onde teria vindo essa quedinha que temos, em maior ou menor grau, para o sofrimento. Realmente não sei, tenho apenas uma vaga ideia. Lembro que quando eu era criança, às vezes me machucava brincando e chorava, e minha vó corria e me acalentava... e eu ficava feliz. Aliás, todo mundo faz assim com as crianças, é super normal. Também cansei de ouvir "quem não chora não mama". Daí vai que chorar e sofrer virou uma saída. Tenho a impressão, - como disse, é só uma ideia, - de que essas atitudes levam alguns de nós a intuir desde cedo que sofrer sempre traz compensação.

A bem da verdade, é muito mais fácil sofrer do que manter a alegria. Para sofrer a gente nem precisa fazer esforço, o sofrimento vem ao natural. E nós mulheres, principalmente, carregamos um fardo que nos acompanha desde os tempos bíblicos. Sempre fomos encorajadas a sofrer: o sofrimento dignifica, diziam, tudo que se conquista pelo sofrimento tem mais sabor, (pura besteira...) e desfiavam um rosário de sandices na nossa cabeça, e o sofrimento grassou. E nossa saúde (física, mental e social) desmoronou, também pudera, isso acaba com qualquer um. 

Agora, o outro lado da moeda. 

Todo mundo gosta da alegria, tenho certeza. Então porque a gente não vive alegre? Sabemos por experiência própria que a alegria é um sentimento ótimo, nos encoraja e fortalece em nossas tempestades. Nos dá mais saúde, rejuvenesce e embeleza. Quando sorrimos, nosso organismo fabrica anticorpos para combater as doenças. Pura ciência, e da boa...rs. Meu Deus, porque então a gente não sorri mais? Por que a gente não escancara a boca de orelha-a-orelha todos os dias? 

Não sei, mas acho que, aquela história de que "sofrer dignifica", há muito vem contribuindo para impedir que cultivemos, (como uma plantinha), o hábito saudável de manter-nos alegres, mesmo nas adversidades. Parece que temos até vergonha de dizer que passamos uma tarde alegre no nosso trabalho. E o que dizer da culpa, quando estamos alegres no cotidiano, sem alguma razão aparente que possa justificar? 

Embora saiba que manter alegria na vida não é nada fácil, sou a favor da alegria. Sofrer por sofrer me dá nos nervos. E mania de lamentar-se, pior ainda. Acredito que a alegria está entre os ingredientes que tornam nossa vida mais agradável e, portanto, deve ser praticada e doada ao próximo, pois alegria também é uma forma de amor. Amor pela vida e pelas pessoas. 

Então proponho uma coisa.

Sei que tristezas e sofrimentos não são opcionais e que às vezes é difícil até acordar e levantar da cama de manhã. Mas uma hora vai passar. E mesmo que você esteja "até aqui" com a vida, dê um tempo para você. Pratique a alegria. Pra-ti-que. Se está triste e quiser chorar, chore, soluce, entre no buraco, faça o luto, faça o que lhe der na telha, mas depois, (eu falei depois), levante a cabeça, olhe-se no espelho e sorria. (Não, não é bobagem). Sorria mesmo. 

Dê uma espiada nesse truque para enganar o cérebro:

Olhe-se no espelho e sorria de orelha-a-orelha. Force e segure o sorriso, um pouquinho só. Conte até seis. Assim você engana seu cérebro e sem se dar conta, você ficará alegre. Repita uma vez. Até dentro do carro dá pra fazer. Tente, dá certo.

Aprendi isso há bastante tempo num livro, já nem lembro mais o nome, mas é muito legal. Claro, no início a gente custa um pouco, parece meio over, ainda mais quando a gente está no meio da tempestade. Mas vale a tentativa, é um esforço pessoal, um aprendizado, um novo olhar. E a gente consegue recuperar as forças. Não duvide. 

E sorria, pois como dizia Chaplin, a alegria é o único jeito da gente enfrentar os problemas da vida e sair ganhando! Mas não esqueça de levantar a cabeça. Aposto que você nunca viu alguém chorar de cabeça erguida não é mesmo? 

- Marli Soares Borges -

segunda-feira, setembro 20, 2021

VINTE DE SETEMBRO, DIA DO GAÚCHO


Parabéns a todos nós, gaúchos e gaúchas
de todas as querências. 
Que a Virgem Maria, primeira prenda do céu, 
olhe por nós, e que o Patrão Celestial nunca nos abandone.




Em tempos "normais", leia-se sem pandemia, costumamos comemorar a Semana Farroupilha - 14 a 20 de setembro - de um jeito muito especial. Durante esse período, nas repartições públicas as pessoas costumam ir trabalhar usando as roupas típicas do gaúcho. E as crianças vão à escola pilchadas. É um orgulho para nós. 

O ponto culminante da festa acontece no dia 20 de setembro, que é o dia do encerramento dos festejos. Tem sempre um belo desfile e as alegorias contam a história do Rio Grande do Sul. Vem muita gente de todos os cantos do Brasil e também do exterior. É uma alegria genuína, pacífica e sem transtornos. Tem sido assim através dos tempos. Tomara que continue.

Não é um desfile de luxo, mas a beleza e o cuidado impressionam. É lindo ver os peões montados a cavalo e as "prendas" (mulheres bonitas) com seus vestidos coloridos. É emocionante o festival das tradições. O coração fica apertado. E as crianças são um capítulo à parte! Por acreditarmos muito nas crianças, elas são incentivadas a participarem dos festejos, inclusive no desfile, para que fortaleçam o sentimento de pertença e para que a nossa tradição jamais seja esquecida. E elas amam desfilar vestidas à caráter: "de" gaúcho e "de" prenda. E a gente vê os olhinhos brilharem!



A lei nº 4.850/1964 oficializou a Ronda Gaúcha, que passou a ser chamada de Semana Farroupilha e, em 1996, o dia 20 de setembro foi oficializado como o Dia do Gaúcho, passando a ser feriado no Rio Grande do Sul. A Semana Farroupilha vai de 14 a 20 de setembro.

sirvam nossas façanhas de modelo a toda terra

HINO RIOGRANDENSE
Letra de: Francisco Pinto da Fontoura
Música de: Joaquim José Mendanha


Como a aurora precursora
Do farol da divindade,
Foi o vinte de setembro
O precursor da liberdade.

Estribilho:
Mostremos valor, constância
Nesta ímpia e injusta guerra,
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra.

Mas não basta pra ser livre
Ser forte, aguerrido e bravo;
Povo que não tem virtude,
Acaba por ser escravo.

Mostremos valor, constância
Nesta ímpia e injusta guerra,
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra.


Um baita abraço, tchê, bem apertado, em toda a gauchada buena que anda campereando por esses pagos da Blogosfera!!!


-Marli Soares Borges-

quinta-feira, setembro 16, 2021

MEU REINO PRA REVER AQUELA TARDE


A Igreja era tão grande, mas tão grande que...

De tempos em tempos começo a fuçar nas minhas lembranças e aparece cada uma! 
O que vou contar é uma história boba, sem a menor graça, mas aconteceu comigo e está na minha cabeça há décadas. E cada vez que lembro, fico com uma pulga atrás da orelha. 


Eu devia ter uns cinco ou seis anos e morávamos - eu e meus avós - numa casa afastada da cidade. Meus dois únicos amigos, Elisa e Marquinhos, moravam na casa ao lado e eram irmãos, lembro deles até hoje. Costumávamos brincar no quintal da minha casa. Mas naquela tarde não teve brinquedo de pega-pega, estava muito calor e o sol fritando. Então resolvemos dar um passeio: visitar a igreja que estava sendo construída ali na esquina, dois terrenos depois. Passamos por debaixo da cerca e saímos escondidos, pois estávamos proibidos de pisar fora do nosso local de brincar. Chegamos na construção e ficamos embasbacados: a igreja era tão grande, mas tão grande que me deu até um arrepio na espinha, parecia que a gente havia encolhido. Olhamos para cima e nosso olhar se perdeu nas alturas. Mas, corajosos, seguimos em frente, pé ante pé, olhos arregalados e bico calado. Todo cuidado é pouco. 

Foi então que vimos os respingos... Pior! sentimos uma saraivada de gotas grossas, milhares, de um vermelho intenso que mais parecia... sangue. Como assim? ninguém está machucado, ai meu Deus, e agora? por que fomos sair escondidos? onde se viu entrar numa igrejona assim, sozinhos? E se tiver um vampiro na tocaia? ou uma alma do outro mundo? por que não ficamos brincando como sempre no nosso santuário? Olhamos pra todos os lados e nada, nenhuma viva alma, um silêncio mortal. E o medo tomou conta de nós. Apavorados saímos dali à toda velocidade, correndo a mil, debaixo daquele sol escaldante. Cheguei em casa alucinada, no maior suadouro e lembro que minha vó me abraçou e não disse uma palavra, apenas secou meu rosto, me deu um pouco d'água e esperou até que eu me acalmasse. Mais tarde ela pediu pra eu contar "tudo", mas não havia nada para contar. Ninguém tinha um arranhão sequer, ninguém sentiu nenhuma dor e ninguém viu nada perigoso. Pensei, pensei e a única coisa real que vimos, uns nos outros, foram uns respingos vermelhos nas nossas roupas. E era coisa pouca. 

Por causa desse "passeio" escondido, fiquei de castigo um tempão sem brincar com meus amigos (que também ficaram de castigo).

Não tem mais minha vó, não tem mais Elisa, não tem mais Marquinhos e minha casa de menina não existe mais. Fecho os olhos para ver melhor e... ah, como eu queria colher margaridas com minha vó, uma vez só, só mais uma, naquele canteiro tão lindo que ela plantava e cuidava com tanto amor! 

Faz bem uns trinta anos que passei por lá novamente, queria rever um pedacinho da minha vida. E avistei a igreja. Sim, ainda existia, desgastada pelo tempo. E para minha surpresa, era uma igrejinha minúscula, pouco mais que uma capela. Meu olhar infantil viu além da aparência e o medo deve ter completado o 'serviço', rs. Quando lembro desse 'causo' sempre acho que falta alguma coisa. Pode ser que nessa volta à infância, minha memória tenha esquecido ou inventado algum detalhe, afinal não sou mais a mesma que vivenciou a história. Meu reino pra rever aquela tarde, em todos os detalhes e saber exatamente o que aconteceu! 

Gosto muito dessas lembranças pueris que a memória me faz reviver. Além da vitalidade que me trazem, representam para mim um alento, uma distração, um refúgio nos dias da minha velhice.

- Marli Soares Borges -

sábado, setembro 11, 2021

O DIA EM QUE AS FLORES DESAPARECERAM


O dia em que as flores desapareceram


Num piscar de olhos, sumiram todas as flores do mundo. A terra ficou feia e triste. Então ela lembrou-se da linda tela que há muito tempo ganhara de sua avó. Foi até seu quarto e ... não pode ser, a tela está viva! Sim! e ali estavam elas, perfeitas: as flores! maravilhosas e coloridas, em todo seu esplendor. Aproximou-se para ver melhor e imediatamente teve a certeza de que eram "de verdade", podia tocá-las e sentir-lhes o perfume. Seu coração transbordou de alegria. Olhou para o céu e agradeceu, obrigada vovó! obrigada! com certeza irei plantá-las! E lá foi ela (re)começar o seu jardim. A vida é uma arte. 


-Marli Soares Borges-



Minha participação no projeto Uma imagem, um conto, proposto pela Norma, do blog "Pensando em Família". A imagem é do calendário dos "Pintores com a Boca e os Pés".